quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Screaming Trees - Sweet Oblivion - 1992


Sabe-se lá porquê, em alguns instantes da vida, todas as energias do mundo parecem ser canalizadas para algum reduto do planeta.

Isso ocorreu no final dos anos 80 e início dos anos 90 numa cidade do norte dos EUA, no estado de Washington. O local? Seattle, claro.


Por alguns destes desígnios caprichos do universo, algo parecia fomentar uma movimentação na fria e chuvosa cidade.


O sucesso da – então ascendente - Microsoft atraía uma grande quantidade de jovens para as universidades locais. Os moleques estavam desejosos em fazer fortuna no ramo da informática. Uma outra empresa gigante, a Boing, também oferecia grandes possibilidades profissionais por aquelas bandas.


As universidades misturavam uma grande fauna de cabeças pensantes. Desde os nerds típicos até aquela turma que também estava apenas interessada em curtir os benefícios da idade e das farras inerentes aos redutos estudantis.


Esse segundo grupo é que lotava os clubes e bares onde as bandas locais e da região se apresentavam. Lembrem-se: Seattle era uma cidade gelada e chuvosa. Reunir os amigos para tomar umas e curtir um som nestes lugares era uma das melhores coisas da vida.


E foi a partir disso que se formou uma interessante cena musical com várias bandas de Seattle e das cidades vizinhas.


Uma destas cidades era Ellensburg. Ficava a 300 Km de Seattle. Na realidade, nem era tão vizinha assim, mas foi importantíssima porque foi deste local que veio o genial Screaming Trees. O nome do grupo é uma referência ao pedal de guitarra.


A banda foi formada na metade dos anos 80 pelos amigos Mark Lanegan (vocais) e pelos irmãos Van Conner (baixo) e Gary Lee Conner (guitarra).


Lançaram álbuns interessantíssimos. Um melhor que o outro, mas foi quando recrutaram o batera Barrett Martin que a banda chegou a formação ideal e gravou o maravilhoso Sweet Oblivion. Neste, eles atingiram a perfeição da fórmula: um rock sujo com fortes influências psicodélicas setentistas devidamente filtradas pelas sonoridades college garageiras dos anos 80.


O ano de lançamento foi 1992. O som das bandas de Seattle dominava as paradas mundo afora.


O Screaming Trees nem de longe tinha a fama dos seus conterrâneos famosos como Nirvana, Pearl Jam, Soundgarden e Alice in Chains, mas foram jogados no mesmo tacho pela mídia ávida pelas "novidades".


Sweet Oblivion é um daqueles álbuns irrepreensíveis. Traz uma sonoridade que capta toda a essência da época.


“Shadow Of The Season” abre o album com guitarras que me fazem pensar em um mecanismo industrial gasto pelo tempo. A voz rouca, grave e “surrada” de Mark Lanegan é soturna, mas não é macabra. Parece ter sida embebida pelos whiskies na estradas da vida.

Martin Barret coloca uma pegada tribal na batera. Peso e ritmo hipnóticos. Soa quase uma invocação (sem querer) aos xamãs americanos. O trampo de guitarras é sujo e dá um clima beirando o místico para a canção. Coisa linda.

Em seguida já emenda “Nearly Lost You”. Mundialmente conhecida por se fazer presente na trilha sonora da famosa comédia romântica ambientada em Seattle, “Singles”.

Talvez seja a canção mais pop do álbum. Levada de bateria mais ritmada e um ar mais “alegre” digamos assim. O clipe tem algumas imagens de máquinas e tratores enferrujados num ferro velho, o que de alguma maneira remete ao termo “grunge” (que eu, particularmente, não gosto). É neste vídeo também que um dos gordinhos da banda rola no chão numa cena patética

“Dollar Bill” parece ter saído de um disco de Neil Young ou do Lynyrd Skynyrd. Começa ao violão e depois recebe o peso das guitarras. O vocal de Lanegan guia a melodia. Climática. O solo de guitarra parece chorar. Linda. O clipe em PB diz muito sobre a estética das bandas da época.


O começo de “More or Less” denuncia toda a tristeza das paisagens da redondeza de Seattle. A guitarra “berra” agonizante e a sensação de solidão permeia o ambiente. Um vazio na estrada é a sensação imediata. Uma longa e cansativa caminhada.


E aqui é preciso frisar o quanto o som dos Screaming Trees parece ser uma trilha sonora de andarilhos sem rumo. Mesmo que isso não esteja implícito nas letras.


"Butterfly" é uma das minhas músicas favoritas para o todo sempre. Daquelas que a gente canta o refrão a plenos pulmões. O clipe é muito bem sacado. Cores fortes e contrastantes. Parece ter sido inspirado na gloriosa série de TV do início dos anos 90: “Twin Peaks”, do genial David Lynch. Não por acaso, a fictícia cidadezinha de “Twin Peaks” ficava próxima a Seattle. Pra corroborar a perfeição, a letra da canção também é um primor.


A psicodelia nas guitarras sujas ressurge em “For Celebrations Past”. É uma daquelas raras canções do álbum que têm um “approaching” mais "alegre". Isso até Lanegan colocar seus vocais intensos e trazer novamente a carga de melancolia necessária para contrabalancear.


A faixa seguinte, "The Secret Kind" remete mais ao hard rock dos anos 70. O riff de guitarra é mais manjado e o trabalho de bateria é excepcional. Espaço para alguns experimentalismos sonoros instrumentais no meio da música. Não é uma faixa ruim, mas é a que menos me chama a atenção num álbum tão perfeito.



Uma banda vinda da fria Seattle teria que ter uma música chamada "Winter Song". Uma bela balada com letra cortante. A voz de Lanegan mais uma vez traz a medida certa para a canção se tornar memorável.

"Troubled Times" tem uma introdução road blues. Depois se torna num rockão poderoso com um riff simples e pungente. É outra faixa que parece ter saído da trilha sonora de "Twin Peaks". Matadora. 


E aí é a vez de "No One Knows", aquela que eu considero a MELHOR música da banda entre todos os álbuns. Um daqueles road blues lindíssimos. Com um vocal comovente e backing maravilhosos que lhe conferem um aura mágica. Dá até vontade de chorar ao ouví-la tamanha é a beleza da mesma. Cortante. Acerta fundo no coração, na alma. O solo é daquelas coisas que só ouvindo para você entender. A guitarra "lamenta" toda a melancolia do mundo em notas musicais perfeitas casando com a poética e triste letra. Música em estado puro. Arte em forma de sentimento.


E para encerrar: "Julie Paradise". Um final digno para aquele que é um dos melhores discos da década de 90.


Vale dizer que a produção ficou a cargo de Don Fleming que soube dosar melodia, peso e sujeira com habilidade e competência.

Um discaço e que, felizmente - contrariando o título - NÃO caiu no esquecimento.

Marcelo Almeida é redator publicitário e nas horas vagas trabalha com ilustrações, quando não esta perdido no labirinto de HQs do seu apartamento.



Faixas:

1. Shadow of the Season
2. Nearly Lost You
3. Dollar Bill
4. More or Less
5. Butterfly
6. For Celebrations Past
7. The Secret Kind
8. Winter Song
9. Troubled Times
10. No One Knows
11. Julie Paradise

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